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16 de março de 2019

Cruz de Mosteiro (?), em Vandoma, Paredes


Foto pessoal - vista da cruz


Cruz de Mosteiro (?), em Vandoma, Paredes

A Cruz 

Esta cruz era assunto de conversa desde há muitos anos. Com o passar do tempo o espaço aonde se situa era apenas um pequeno campo agrícola e que os residentes locais foram com o tempo fazendo desaparecer as marcas nelas possivelmente existentes.
Hoje em dia já se encontra de pé e delimitada por muros de pedra amontoada que entronca com caminho em terra batida e que segundo dizem é pertença da Diocese do Porto.
Estes pequenos indícios ajudam a perceber de que algo de uma ínfima história haverá por detrás destas marcas.
Em conversa com morador local foi dito que há muitos anos e após o 25 de abril ocorreram àquele local alunos a estudarem o terreno tendo sido apanhadas amostras e recolhidas (sabe-se lá para quem?) ao qual não mais permitiu dar garantias da existência religiosa naquele local. 
O que é certo, e que a história aparentemente pretende demonstrar, é de que em Vandoma existiu um mosteiro, com origens eremíticas e ao que tudo indica de uma ordem religiosa regular dos Premonstrateneses com linhas orientadores da ordem do Santo Agostinho.
Os limites actuais estão bem definidos pelos limites dos muros e casa adjacente, sendo que a tardoz tal já não permite perceber o seu fim.
O local, há mil anos atrás, justificava plenamente toda a filosofia eremítica daquele tempo, isto é, isolado, de uma pequena comunidade destinada à devoção da sua fé, mas próximos da comunidade populacional, para garantia de manutenção do povoado e interligação espiritual da mesma. Dava garantias da proximidade a uma via de ligação e ao grandes centros populacionais e religiosos, a estrada de ligação entre Porto e Penafiel e também de uma proximidade da ligação entre Valongo a Entre-os-Rios.
Esperemos que se venha a desenvolver mais estudos aprofundados sobre este mistério e que até à data pouco há de garantias da veracidade deste tema e deste local. 
vista geral da serra do Muro - google maps

vista do Lugar de Palhais, Vandoma - localização da cruz

possível delimitação actual do terreno - localização da cruz
foto pessoal
foto pessoal
foto pessoal


A História 
A Serra do Muro de Vandoma/Baltar, concelho de Paredes, aparece registada em documentos medievais por "mons Benidoma ou Bendoma" representando uma referência fundamental ao território circundante, pela sua altitude de 519 m, e como tendo as condições naturais de defesa e do domínio visual de grande alcance.
Os vestígios arqueológicos apontam para uma ocupação desde o Bronze Final (1300-700 a.c.) até à Idade Média.
O topónimo Serra do Muro advém da existência de uma muralha com cerca de 4 m de largura e de 3.927 m de perímetro, num circuito contínuo mas irregular e que abrange as duas freguesias limítrofes, de Vandoma e Baltar.
Este muro é construído por pedra aparelhada entre si e assentes em seco, constituído por dois paramentos paralelos preenchidos interiormente com pedra miúda.
No interior do recinto amuralhado aparecem à superfície materiais líticos, fragmentos de cerâmica doméstica e tégula resultante de uma povoação castreja, como muitas povoações deste género que se espalharam pelo norte de Portugal.
Na sua envolvente próxima foi recolhida uma ponta de uma lança de bronze e de muitas outras peças recolhidas por particulares e que ao longo deste o século XX tem permitido aos historiadores de se servirem dessas ferramentas para compilação de matéria histórica e enriquecimento local.
Mas nem tudo foi conseguido como matéria factual, pois há relatos e escritos da existência de ter existido um mosteiro nesta serra do Muro e que pouco  ou nada se sabe do local e da sua existência.

Contudo, comecemos pelos antecedentes históricos que possivelmente permitiram fundamentar e crer nos primórdios da sua origem e existência.
Na obra "Eremitas Portugueses no séc. XII", de José Mattoso, out. 1971, é descrita em forma de abordagem, do papel dos eremitas, como principais fenómenos da vida cristã e que tudo leva a crer que esta presença isolada dos eremitas terá tido as suas origens nos séculos XI e XII em Portugal.
Os eremitas desempenharam um papel importante no crescimento da nação. Por eles se interessaram o poder régio e das autoridades eclesiásticas, tendo partilhado na politica do repovoamento e na prestação de serviços a viajantes, inserindo-se em acções de carácter económico e social.
No mesmo documento, aborda a vida eremítica não só isolada mas também de pequenos grupos que se situavam em lugares e de igrejas isoladas, não paroquiais ou destituídas de clérigos.
Aquela imagem de anacoretas que viviam completamente isolados e sem qualquer igreja ou capela, tal como por vezes temos essa visão das lendas populares, só muito raramente se poderá comprovar de terem existido, havendo contudo situações possíveis e pontualmente localizadas.
Grande parte da cronologia referida na obra, refere-se ao período a partir do ano de 1106, com o Conde D. Henrique, na região do condado Portucalense, passando a incrementar e com maior impulso com a intervenção afincada de D. Afonso Henriques, podendo-se inferir nestes documentos que terão tido um acentuado interesse do rei, pelos eremitas, durante os primeiros anos do governo.
São os exemplos de:
ano de 1106 - S. Romão de Seia, Seia, com doação a presbíteros, para povoarem e cultivarem a região;
ano de 1120 (?) - S. Eufémia de Ferreira de Aves, Satão, com referência a um eremitério;
Com o poder régio de D. Afonso Henriques, os mosteiros e os bispados, foram crescendo com cartas e doações que se conhece pela documentação existente, tais como:
1127 - S. Vicente de Fragoso, Barcelos, carta de couto ao eremitério local;
1133 - S. Comba do Rio Corgo, Stº. Marta de Penaguião, carta de couto a eremitas locais;
1134 - S. Pedro da Cova, Gondomar, doação aos seus monges, com o consentimento do Bispo do Porto;
1139 - S. Cristóvão de Lafões, S. Pedro do Sul, carta de couto a eremitério de Lafões;
1140 - S. Marinha de Vilarinho de Parada, Sabrosa, carta de couto à ermida local em favor da congregação de D. Nuno Gonçalves;
1140 - S. Cruz do Bispo, Maia, a prioresa do mosteiro de S. Cristóvão de Rio Tinto doa a confrades da ermida local;
1141 - Santiago de Sever do Vouga, Sever do Vouga, unem-se ao mosteiro de Tarouca e mais tarde recebem carta de couto, pela parte do rei D. Afonso Henriques;
1142 - S. João do Rio Arda, Sela, Arouca, o rei concede direitos e obrigações ao mosteiro de Grijó com a obrigação de manter eremitas junto ao Rio Arda;
1145 - S. Miguel da Ermida de Riba Paiva, Castro Daire, o rei dá uma herdade na ermida de S. João da Foz do Douro a D. Roberto e seus confrades, da ermida de Rio Paiva;
1146 - S. João de Recião, Várzea de Abrunhais, Lamego, D. Afonso Henriques concede carta de couto a Mendo Soares e às monjas;
1148 - S. Miguel do Bouro, Amares, o rei dá a D. Nuno, abade do mosteiro e à comunidade, a igreja de Santa Marta e mais tarde outras regalias;
Finalmente,
em 1180, S. Eulália de Vandoma, Paredes, D. Afonso Henriques concede carta de couto ao mosteiro de Vandoma: Inq. 573 (DR I p. 532, ref. 88).
e, em 1186, o Bispo do Porto, D. Fernando Martins, contempla a ermida de Vandoma no seu testamento (Censual Cabido da Sé do Porto, 388).
Concluí-se que, com esta descrição, que desde 1133 a 1148 existiu um acumular de referências à existência de eremitérios e suas relações com a igreja, associados a locais de repovoamento ou a locais mais isolados que permitiam a existência humana e o comprovar do domínio Portucalense que D. Afonso Henriques pretendeu demonstrar, inferindo um acentuado interesse pelos eremitas durante estes primeiros anos do seu governo.
É visível, pelos documentos, que o movimento eremítico atingiu o seu auge entre estes anos, sendo contudo mais tardio do que no centro da Europa, onde a sua intensidade se verificou durante o século XI.
O eremitismo português não cessa no fim do séc. XII, mas desloca-se provavelmente mais para Sul, acabando por desaparecer durante o final desse século.
Contudo, a literatura religiosa e profana mais conhecida em Portugal parece ainda manifestar um ambiente favorável ao eremitismo pelos séculos XIV e XV.
Pela documento junto constata-se que a distribuição eremítica do mapa Portucalense, verifica-se essencialmente nos arredores dos burgos importantes, a cidade do Porto, com Santa Cruz do Bispo, S. Pedro da Cova e Vandoma e da cidade de Lamego, pelo mosteiro de Recião. São os restantes, e em segundo lugar, que a escolha se propagou pelas franjas de lugares que estavam em vias de repovoamento no principio do séc. XII.
A posição geográfica dos eremitérios estudados parece, portanto, relacionados com situações de povoamento do País, embora não fossem lugares completamente desertos, pois ficavam à beira de terras possivelmente repovoadas no final do séc. XI, permitindo manter a afixação dos habitantes a lugares de fraca densidade humana.
Por estas razões não admira que a autoridade régia tenha querido favorecer os eremitas concedendo-lhes privilégios importantes e gratuitos, pois essas cartas não mencionam qualquer preços ou dádiva oferecida pelos interessados, como foi o caso de Vandoma.
Se o estado e evolução do repovoamento determinaram as zonas escolhidas pelos eremitas para se fixarem, as estradas e caminhos existentes na altura, ou que então se criaram, devem tê-los induzido a fixarem-se em lugares mais determinados. Com efeito, verifica-se, noutros países, que os anacoretas medievais procuravam frequentemente sítios desertos, mas junto ou perto de estradas e burgos, e não tanto em solidão absoluta. Permitiam-lhes obter alguns géneros e utensílios indispensáveis para a sua subsistência, e praticar a hospitalidade.
O fenómeno verifica-se também entre nós, apesar de os mapas das vias portuguesas serem mal conhecidos, contudo é bem visível que nalguns casos mostram claramente que os monges estavam bem servidos de comunicações, e podiam, sem dúvida alcançar as vias mais importantes, pois ao longo dos seus trajectos existiam desvios, como é o caso de Vandoma, que com a ligação entre o Porto para Penafiel ou para Entre os Rios, através de Valongo, tanto o mosteiro de S. Pedro da Cova como o de Vandoma facilmente esses caminhos poderiam ser alcançados e permitir comunicarem e interligarem-se rapidamente.
Eremitas Portugueses do Século XII - Mapa com localização ao eremitério de Vandoma

Estas comunidades eremíticas não tinham uma ordem rígida religiosa a seguir, contudo o mosteiro da Ermida de Santa Maria de Paiva, em Castro Daire, seguia, em Portugal, as regras da Ordem Premonstratense, uma ordem de cónegos regulares que seguiam a Regra de Santo Agostinho, fundada em Prémontré, localidade no norte de França, por S. Norberto (1082-1134), por volta de 1120 e aprovadas pelo Papa Honório II, em 1126. De Vandoma nada ou pouco se sabe, mas existem indícios que a põe em relação com a ermida do Corgo, e portanto com os Premonstratenses. Aqui era habitada por uma comunidade regular durante o séc. XIII.
Instrumentos de acesso à informação das Instituições Monásticas Beneditinas - referência ao mosteiro de Vandoma (ver ultimo da lista)

Esta ordem entrou pela Península Ibérica pela Catalunha, e expandiu-se pelos vários reinos cristãos peninsulares nos séculos XII e XIII.
Em 1515, no caso de Vandoma, aquando da tomada de posse e parte das suas rendas para a Ordem de Cristo, já é mencionado como o "mosteiro de Sancta Eollalia de Bandoma do dicto bispado do Porto ora tornado em igreja paroquial". Foi extinto em 1570. A igreja passou então a abadia secular, anexada ao Colégio de São Lourenço da Companhia de Jesus, Porto. Há registos que dois dos seus altares encontram-se na actual igreja matriz e que algumas pedras deste mosteiro foram aproveitadas nas casas e muros das pessoas que entretanto se estabeleceram naquele local.
Da Galeria de Ordens Religiosas e Militares, desde a remota antiguidade até aos nossos dias (1847) - breves referências ao mosteiro de Vandoma

Este mosteiro deixa importante legado histórico ao longo dos tempos, assim como Vandoma teria conseguido reunir um significativo espólio cultural e arquitectónico, mas que aparentemente se transformou em ruínas ou desapareceu, desconhecendo-se ao certo o seu verdadeiro lugar.
Há quem refira, o lugar de Palhais como o verdadeiro lugar, devido a pequenos vestígios encontrados e onde se localiza esta cruz com que iniciamos este assunto.
Há conhecimento, por referencias de moradores locais, que após a revolução de abril, várias escolas vindas da cidade do Porto se deslocaram àquele local e que reuniram um conjunto de materiais antigos, como por exemplo, moedas e outros acessórios, que demonstram que naquele local existiram indícios de actividade humana posterior ao Bronze Final.
Corografia portuguesa e descrição topográfica do famoso reyno de Portugal (Tomo I9, de P. António Carvalho da Costa (1706) - breves referências ao mosteiro de Vandoma


A Ordem Premonstratenses
A Ordem de São Norberto, actualmente chamada de Ordem Premonstratenses, ou dos cónegos regulares Premonstratenses, também conhecidos por cónegos Brancos ou cónegos de São Norberto, consiste num ramo que derivou da Ordem dos cónegos regulares de Santo Agostinho, fundado em 1119 por São Norberto (nascido em Xanten, no Baixo Reno, por volta do ano de 1080) em Prémontré, um pântano isolado na floresta de Coucy, na diocese de Laon, França.
A Ordem disseminou-se facilmente. Ainda em vida do seu fundador, já existiam casas premonstratenses na Síria e na Palestina. Manteve durante muito tempo a sua austeridade rígida mas, ao longo do tempo, à medida em que a Ordem ia enriquecendo, em Portugal, estabeleceram-se na Ermida de Paiva e talvez no mosteiro de Vandoma, mas a sua história está deficientemente registada.

Quem foram:
Foram cónegos regulares, isto é, religiosos que formam uma igreja local em torno do Abade e em comunhão com a igreja de Roma.
São religiosos sacerdotes, homens que procuram seguir os exemplos de Jesus Cristo e viver o Evangelho, consagrados a Deus pela promessa de conversão continua dos costumes pelos votos de castidade, pobreza e obediência, ordenados para o serviço para o povo de Deus.
A Ordem Premonstratenses foi fundada por São Norberto, o Apóstolo da Eucaristia, em 1121, em Prémontré ("mostrado antes").
O ideal de vida está em Actos Apostólicos 4,32: "A multidão dos fieis era um só coração e uma só alma". É dessa maneira que buscamos viver e, para organizar nossa vida comunitária, seguimos a Regra de Santo Agostinho.

Espiritualidade Premonstratenses:
São homens de oração, assim podendo obter a realização profunda do ser, "que está sempre inquieto enquanto não encontra Deus", como diz Santo Agostinho.
Como Premonstratenses, receberam do fundador, São Norberto, duas heranças especiais: a Adoração Eucarística e um Amor Especial por Maria. Nossa espiritualidade, como a de todos os cristãos, consiste em buscar sempre a união com Deus pela vida no Espírito de Jesus. No íntimo de nosso coração e, na vida litúrgica da comunidade, procuramos a paz da intimidade com o Pai.

Informação e documentação retirados de:
- Eremitas Portugueses no Século XII, de José Mattoso, Centro de Estudos Históricos, Lisboa, Out. de 1971;
- Estudos em Homenagem ao Prof. José Amadeu Coelho Dias, em Os Instrumentos de acesso à informação das Instituições monásticas beneditinas: uma abordagem critica, de Fernanda Ribeiro (Fac. Letras da Univ. do Porto, pág. 309;
- http://www.cm-paredes.pt
- https://pt.wikipedia.org.wiki.vandoma
- http://www.municipiosefreguesias.pt
- https://www.geocaching.com
- https://books.google.pt
- Cadastro de Fundos/MON/CVSEVPRD, convento de Santa Eulália de Vandoma - Paredes 1544-1562
- htpps://www.zeemaps.com
- http://a-origem-do.homem.blogspot.pt
- https://www.visitemontemuro.pt

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