NOTA: A quem consulte e aprecie este blogue e possa contribuir com comentários, críticas ou correcções têm a minha consideração.
Aqueles que por seu entendimento, possam ser proprietários de alguns elementos fotográficos, e pretendam a retirada dessa foto, agradeço que me seja comunicada para evitar constrangimentos pessoais.

Obrigado.

15 de novembro de 2020

Palacete dos Leite Pereira - Porto

                                                              

Os Leite Pereira


Foto pessoal da Pedra de Armas

Arquivo Histórico Municipal do Porto - Foto de Bomfim Barreiros

Esta pedra de armas encontra-se aplicada sobre a porta de entrada do edifício secular, situado na rua das Taipas, n.º 74, no Porto.

Arquivo Histórico Municipal do Porto - Foto de Bomfim Barreiros 1943

Descrição da Pedra 

Brasão do século XVIII

Material - Granito

Classificação - Heráldica de Família

Escudo - Oval

Formato - Pleno ou Simples

Leitura - I - Leite (Leite Pereira, do Porto)

Timbre - uma cruz de vermelho, entre duas flores-de-lis, verde

Elmo - de perfil, com paquife

Cores - 

I - esquartelado, 1º e 3º de Leite, de verde, com três flores-de-lis de ouro postas em roquete; 2º e 4º de Pereira, de vermelho, uma cruz de prata, flordelizada e vazia;


Pequenas Histórias da casa

O nome desta rua era inicialmente chamada de rua dos Olivais e foi alterada, no ano de 1486, devido ao surto de epidemia de peste ocorrida naquela época e naquele arruamento, que por motivos de saúde foi totalmente entaipada, passando a designar-se de rua das Taipas.

Nos finais do séc. XVII esta propriedade era pertença de Francisco Juzarte Maldonado, Correio-mor de Coimbra. Nos princípios do séc. XVIII sofreu um incêndio tendo sofrido obras de reconstrução e sido vendida a Maria Leite Pereira de Melo.

Pertenceu a Pedro da Silva da Fonseca de Cerveira Leite e Bourbon e posteriormente a seus familiares, tendo sido casado com Dona Mariana da Silva Freitas de Meneses Cirne de Sousa, ultima proprietária do edifício situado no ângulo da rua da Fábrica com a travessa de mesmo nome, conhecida pela Casa da Fábrica.

Este brasão tem a correspondência com o brasão da Quinta de Ramalde e que se associa a esta família.

Foto pessoal da Porta de Entrada

Arquivo Histórico Municipal do Porto - Foto de Bomfim Barreiros 1933

Trata-se um de edifício nobre, de planta retangular com 4 pisos, tendo em conta o enorme declive do arruamento, está constituída por rés do chão e mais 3 níveis de pisos. A fachada é rebocada, caiada e pintada, encontrando-se em completa degradação e ruina.

Está datada em vários períodos temporais, séc. XVII, XVIII e XIX, tendo sofrido alterações ao longo destes períodos de tempo, incluindo a aplicação da pedra de armas sobre a porta de entrada pelo então representante da família Leite Pereira.

Após o abandono da casa de família aquele edifício foi ocupado com várias funções, isto é, pelo Clube Inglês que mais tarde se transferiu para a rua das Virtudes, n.º 11, ali bem perto, foi igualmente ocupada por uma empresa "Figueira, Lda.", confirmada por documentos de arquivo, para construção de várias estufas para armazenamento de bananas, e espaço de arquivo. Posteriormente terá sido ocupada pela Drogaria Pinheiro & Oliveira.

Foto pessoal da Fachada Principal (actualidade)

Foto pessoal da Fachada Principal (actualidade)

Arquivo Histórico Municipal do Porto - Vista conjunta do Palacete e atrás do antigo  Palacete de Brito e Cunha 
Ano de 1961 - Teófilo Rego

Arquivo Histórico Municipal do Porto - Vista conjunta do Palacete e atrás do antigo  Palacete de Brito e Cunha 
Ano de 1962 

Arquivo Histórico Municipal do Porto - Vista de tecto interior aquando do Clube Inglês (anos 50)

Arquivo Histórico Municipal do Porto - Drogaria Pinheiro & Oliveira (anos 1940)


Fotos e informação retiradas de:

- Brasões e Pedras de Armas do Porto, Manuel Cunha

- monumentosdesaparecidos.blogspot.com

- Arquivo Histórico Municipal do Porto

- gisaweb.cm-porto.pt



11 de novembro de 2020

Brasão dos Barroso Pereira, Porto

 

Os Barroso Pereira

Foto retirada do Arquivo Municipal do Porto

Esta pedra de armas situava-se no largo Guilherme Gomes Fernandes na freguesia da Vitória, na cidade do Porto. Estava aplicada numa fachada cujo edifício apalaçado já não se encontra no local original desde os anos 60, do século passado, pois a casa onde se inseria foi demolida para dar lugar a um prédio moderno (à época) e onde se encontrava há poucos anos a Livraria do Estado.

Fachada da Casa - Foto retirada de https://www.facebook.com/PortoDesaparecido


Neste palacete esteve instalada uma das mais célebres casas de fotografia da cidade do Porto, a União e lá funcionaram vários escritórios e comércio de serviços, e especialmente de um consultório, do primeiro radiologista do Porto, Prof. Roberto de Carvalho, e que foi visita frequente de Almeida Garrett na sua actividade diária. 


Vista da estátua, palacete e "ferro de engomar" - ano de 1914

Foto retirada de https://www.facebook.com/PortoDesaparecido


A casa destaca-se ao fundo da foto, atrás de um busto do bombeiro Guilherme Gomes Fernandes, instalado na praça ou largo que tomou o seu nome e que conjuntamente com o edifício contíguo e muito esguio, também conhecido por "ferro de engomar", e que deram a um inestético prédio de gaveto entre a rua de D. Carlos (atual rua José falcão) e o largo, transformando-o para construção habitacional.

Já anteriormente, esta praça possuiu vários nomes e que se foram alterando ao longo do tempo e adequadas em função das actividades que lá se manifestaram, como Via Sacra, praça da Farinha, do Pão ou da Feira do Pão e também praça de Santa Teresa.

 

Feira - Foto retirada de https://www.facebook.com/PortoDesaparecido

Descrição da Pedra 

Brasão do século XVIII

Material - Granito

Classificação - Heráldica de Família

Escudo - Fantasia

Formato - Partido

Leitura - I - Pereira e II - Barroso

Timbre - de Barroso, um leão

Elmo - de lado, sem paquife

Cores - 

I - Pereira, de vermelho, com uma cruz de prata florenciada e vazia do campo;

II - Barroso, de vermelho, com cinco leões de púrpura, armados e lampassados de ouro, cada um carregado de três faixas de mesmo, postos em sautor;


Texto de Eugénio de Andrea da Cunha e Freitas

"em Notícias do Velho Porto, VI - A casa dos Barrosos Pereiras a Santa Teresa", pág.195-197

" No antigo Largo de Santa Teresa, hoje baptizada em Praça de Guilhermo Gomes Fernandes, esquinando para a Rua José Falcão, existe ainda uma grande casa nobre setecentista, de que o risco tem sido atribuído a Nicolau Nasoni, o notável arquitecto italiano, que durante largas décadas enriqueceu a cidade com a sua arte.

A casa deve ter sido edificada na segunda metade do século XVIII pelo Desembargador António Barroso Pereira e por sua mulher, D. Maria Inácia da Costa Sampaio, ou por seu filho o Dr. José Barroso Pereira, casado com D. Rita Josefa Piceluga, da família lisboeta deste apelido, originária de Itália.

Na posse dela sucedeu um filho destes, António Maria Barroso Pereira, fidalgo da Casa Real, casado com D. Maria José Bravo Cardoso Torres Correia Pereira de Lacerda, filha do Desembargador Rodrigo Bravo Cardoso Torres e mulher, D. Maria Máxima de Moura e Castro.

Família de magistrados, certamente abastada, de representação social - vislumbra-se, por entre o laconismo dos documentos, uma velha família da pequena nobreza, no Portugal antigo -, estes Barrosos Pereiras tinham ali a sua residência citadina; e mandara, colocar sobre o portal de entrada as suas armas: um escudo partido de Pereiras e Barrosos, com o seu elmo e seu timbre, tudo a gosto da época.

Meado o século passado, ainda a casa estava na posse desta gente.

O primeiro a favor de quem foi registada na respectiva Conservatória do Registo Predial era Rodrigo Bravo Barroso Torres, filho dos mencionados António Maria e  D. Maria José, que nascera em S. Miguel de Matos, no antigo concelho de Bem-viver (hoje incorporado no de Marco de Canaveses) e foi casado com Guilhermina Júlia de Sousa Bravo, filha de Albino Pereira de Sousa Pederneira e de sua mulher, D. Gertrudes Magna da Cunha Bessa, da Casa de Covelas, em Rio de Moinhos (Penafiel).

Foram estes proprietários que, por escritura de 21 de Maio de 1874, venderam a casa familiar do Largo de Santa Teresa, a António José Soares, negociante, da Ruas das Oliveiras.

Em 1898 era dona do prédio D. Maria Augusta Sampaio de Brito, casada dois anos depois com Manuel Guilherme Alves Machado.

E este, em 1956, doo-a a sua filha D. Delminda Sampaio Machado e a seu genro, o Dr. Francisco da Cunha Freitas Mourão de Sotomaior.

Destinada, de há muito, a instalações comerciais, consultórios médicos, e outros fins de rendimento, a casa não perdei ainda, ao menos exteriormente, a fachada principal, o seu ar de nobreza setecentista, e é um dos curiosos exemplares da arquitectura civil da época, acrescentado para mais o seu valor pela provável paternidade nasoniana.

Diz-se que vai brevemente desaparecer, para nos seus chãos se edificar um desses grandes, horríveis, rendosos galinheiros, que estão manchando e desvirtuando o carácter tão portuense, da arquitectura da cidade.

Esperamos que as entidades responsáveis pelo nosso património artístico, já tão escasso, não deixem cometer mais esse feio pecado. Pecado feio e inútil... salvo para os que se propõem usufruir dos correlativos benefícios financeiros."

Curiosidade:

Sem qualquer certeza, embora com uma proximidade relativa, o brasão existente na Quinta do Meilão, em Águas Santas deverá ter alguma correlação com os proprietários deste prédio, por ter a mesma representação, isto é:

A quinta em questão está designada de Quinta do Meilão e o seu nome é pouco ortodoxo e quase inexistente na língua portuguesa. O nome deverá ter advindo da Dona Inácia Joana Meilão Pereira, de origens da Galiza, que era casada com o Desembargador João Barroso Pereira, avós de António Barroso Pereira. Se o nome estiver de facto associado, a ligação desta casa à quinta é inevitável.

Ficará para outras descobertas, pois falta a sua comprovação.


Fotos e informação retiradas de:

- Brasões e Pedras de Armas do Porto, Manuel Cunha

- monumentosdesaparecidos.blogspot.com

- www.facebook.com.livroportodesaparecido

- aportanobre.blogs.sapo.pt

- O Tripeiro, série VI, Ano II, p. 3644






 

 

 

 

17 de maio de 2020

Victorino Coelho Pereira


Victorino Coelho Pereira, Torna-Viagem de Baltar
Manuel Cunha, Eng. Civil
Palavra-chave: Coelho Pereira; Torna-viagem; Baltar

A designação toponímica assume particular importância na preservação da memória e identidade de um povo. Permite perpetuar nomes, factos e eventos, dando a conhecer a evolução histórica dos lugares e respetivas populações, para além de facilitar a localização geográfica. Essa designação, por vezes, advêm dos nomes de famílias locais.
No presente caso, o lugar da “Pereira”, em Baltar, teve esse pressuposto. Com o passar do tempo, este lugar foi absorvido pelo lugar da Gralheira.
No séc. XVIII, a existência deste lugar provinha da família que lá residia, a família “Pereira”. Por herança, a casa-mãe terá ficado para o filho mais velho, Manoel Coelho Pereira, que casou (já em idade tardia) com Maria Thomázia (17 anos mais nova). Desta união, nasceram 14 filhos, sobrevivendo 13 deles. Todos nasceram nesta casa centenária. A data da mesma encontra-se inscrita  na porta de entrada - 1735, a qual, provavelmente, se refere à data de ampliação e/ou restauro. Os antepassados de Manuel Coelho Pereira terão nascido nesta casa anteriormente a esta data.
Sobre este apelido e sobre um dos filhos desta família, Victorino Coelho Pereira, se fará uma breve abordagem da sua marca na terra de Baltar e do seu período de emigração pelo Brasil.
A mãe, Maria Thomázia Coelho Barbosa, com a sua diferença de idade em relação ao pai e com maior energia e jovialidade, terá dado um forte impulso na educação dos filhos. Os rapazes foram para a cidade do Porto como aprendizes em lojas comerciais. Este contato com a cidade deu a Maria Thomázia a visão de que estaria ali o futuro dos seus rapazes (ainda de tenra idade) e, mais tarde, encorajou-os a emigrarem para o “eldorado” brasileiro - prática e destino corrente da época. 

A descendência de Manoel Coelho Pereira e Maria Thomásia Coelho Barbosa reflete-se no intervalo de tempo entre o 1º nascimento e o ultimo irmão vivo, cerca de 20 anos entre si e que resultaram nos 13 filhos sobrevivos:
          António Joaquim Coelho Pereira (n - 1832 / f - 1913)
          Manoel Joaquim Coelho Pereira (n - 1836 / f - 1914)
          António Coelho Pereira (n - 1838 / f - ?)
          Belmiro Coelho Pereira (n - 1839 / f - 1911)
          José António Coelho Pereira (n - 1840 / f - 1909)
          Lino Coelho Pereira (n - 1842 / f - 1891)
          Firmino Coelho Pereira (n - 1843 / f - 1916)
          Maria Rita Coelho Pereira (n - 1844 / f - 1931)
          Anna Maria Coelho Pereira (n - 1847 / f - 1910)
          Margarida Rita Coelho Pereira (n - 1848 / f - ?)
          David Coelho Pereira (n - 1849 / f - 1920)
          Victorino Coelho Pereira (n - 1851 / f - 1922)
          Cecília dos Santos Coelho Pereira (n - 1852 / f - 1941)
          Emília da Concepção Coelho Pereira (n - 1854 / f – 1855)
Dos 9 rapazes desta família, pelo menos 5 emigraram para o Brasil. Ainda existe muita informação obscura e desconhecida, que não permite retirar conclusões de todo o processo das suas vidas pessoais. As informações apenas são conhecidas pelo espólio documental do irmão mais novo, Victorino, e por outros documentos dispersos. 

Victorino nasceu a 29/1/1851 e manteve-se solteiro até à sua morte a 3/2/1922. Foi o último dos filhos - com 13 anos - a emigrar para junto de seus irmãos mais velhos.
Iniciou-se como “marçano” na loja de seu irmão Manoel Joaquim, no Porto. Com a ida para o Brasil, terá continuado a ser aprendiz, até se inserir na sociedade de seus irmãos, Belmiro e Firmino, a qual tinha como sócio Valentim, sendo designada originalmente de “Pereira & Valentim e Cª.”.
Esta empresa, ao longo do tempo, serviu de entreposto com entradas e saídas de novos sócios, cujas quotas vendiam aos familiares, então chegados de Portugal. A sua designação alterava-se em função dos seus apelidos, como se comprova pela imagem apresentada de “Pereira, Fernandes e Cª. – Comércio de Fazendas e Roupas por Atacado”. 

A empresa estava localizada num prédio de 12 entradas, no gaveto da rua do Mercado e a do Ouvidor, no centro das maiores artérias da época do Rio de Janeiro.
Victorino, em poucos anos, terá criado uma fortuna de grande dimensão. Cedo entendeu regressar a Portugal - 44 anos de idade. O legado patrimonial manteve -se aquando do seu regresso a Baltar, local escolhido para a sua residência. 

Em 1895, regressou em definitivo com uma enorme fortuna. Tinha previsto regressar antes, mas tinha negócios que se encontravam por concluir.

Após a sua chegada, fez um passeio pela Europa e findo o mesmo remeteu-se à sua casa, em Baltar, que tinha comprado à sua sobrinha, filha de Lino, entretanto falecido.
Esta casa situa-se à face da estrada principal, em frente a outras duas casas dos seus irmãos, Belmiro e Firmino (uma encontra-se degradada e outra foi demolida).
No Verão, Vitorino passava alguns dias nas termas do Gerês ou de São Vicente, em Entre-os-Rios. Para esta última acompanhavam-no algumas sobrinhas e uns primos órfãos de um familiar falecido no Brasil, Por variadas vezes, apareciam-lhe outros familiares para pedidos de favores pessoais, como era frequente este tipo de pedidos desde que se estabeleceu em Baltar. 
Em regra cedia a essas solicitações, devido à sua bondade e boa vontade, qualidades reconhecidas por todos.
A sua vivência em Baltar, permitiu-lhe manter-se próximo de seus pais e irmãs e estar em contato permanente com seus irmãos e sobrinhos mais distantes, através de correspondência continua quer para o Porto quer para o Brasil.
Na sua casa, tinha permanentemente a presença de familiares. Como companhia assídua e permanente tinha a filha da sua irmã mais nova, de nome Rosário, uma das sobrinhas, de quem era padrinho.
Mesmo perante ela, tinha uma atitude de vigor e firmeza nas suas ações diárias, no sentido de manter uma educação austera, que se impunha naquela época.
O seu rigor e minúcia, permitiu-lhe manter todos os seus negócios no Brasil. Estes foram controlados à distância através de troca de correspondência muito cuidadosa e elaborada, e guardada, religiosamente, conforme se comprova pela documentação.
Tudo fez para proteger a sua família e satisfazer a maior parte dos pedidos de ajuda que lhe eram permanentemente solicitados. Mas, devido à sua personalidade integra e muito própria, nem sempre acedia aos apelos que lhe eram feitos. Merece realce o grande pormenor e rigor na organização dos registos de  todos os empréstimos e respetivos pagamentos.
Como prova da dimensão dos seus bens, em Baltar, tinha permanentemente ao seu serviço um conjunto de pessoas: pedreiros, carpinteiros e trabalhadores agrícolas, que comiam diariamente na grande cozinha de sua casa.
Aquando da sua morte e, por ser solteiro, os seus bens contemplavam uma tão vasta quantidade de património, não só em Portugal como no Brasil, bem como em papel financeiro. A sua herança gerou um conflito entre duas fações de familiares, cujos trâmites em tribunal perduraram cerca de 20 anos e ficou conhecida, na época, - “Questão de Baltar”.
A guerra jurídica prevaleceu para o lado dos familiares herdeiros no testamento, em prejuízo dos familiares que nada herdavam e que entendiam ter o mesmo direito. Esta “Questão” só terminou em decisão na última instância, no Supremo.
Do seu testamento resultou que, a sua fortuna seria distribuída por mais de 120 pessoas e instituições. Resumidamente, pode-se mencionar as seguintes instituições listadas:
- na cidade do Rio de Janeiro: a Sociedade Portuguesa de Beneficência, a Ordem Terceira de S. Francisco, o Gabinete Português de Leitura e a Caixa de Socorro D. Pedro V;
- em Portugal, a Creche da Santa Marinha, em V. N. Gaia e no Porto: Santa Casa da Misericórdia, Asilo da Ordem do Terço, Asilo de S. João, Asilo das Velhinhas e Asilo dos Velhinhos, Asilo Barão Nova Sintra, Irmãzinhas Pobres, Oficina de S. José, Creche do Comércio do Porto, Creche da Infância Desvalida, Pobres Protegidos do Comércio do Porto, Casa de Caridade dos Surdos-Mudos, Presos da Cadeia da Relação do Porto; e no concelho, onde nasceu: Santa Casa da Misericórdia, Associação de Socorros Mútuos, Associação dos Bombeiros Voluntários e Presos da Cadeia de Paredes.
Todos os restantes bens foram primorosamente distribuídos pelos seus familiares e empregados pessoais, assim como, teve o cuidado em não desfazer quintas e parcelas, que mais se adequavam entre si a fim de evitar o fracionamento desses bens.
De todos os irmãos, Victorino, terá sido o maior impulsionador e apaixonado pela sua terra natal, ao deixar a distribuição futura dos seus bens de forma ponderada e criteriosa.
A generosidade e a correção das suas ideias eram evidentes, quer pela forma como era reconhecido por todos quer pela retidão das suas decisões.
Desta família seguiram os passos da emigração muitos outros sobrinhos, que se serviram da empresa inicial, Pereira e Valentim, para prosseguirem o caminho do enriquecimento.
Dos 5 filhos emigrantes de Manoel Coelho Pereira e Maria Thomásia Coelho Barbosa, 3 deles deixaram as marcas na sua terra natal através de terrenos agrícolas, montados, quintas e fundamentalmente das suas casas chamadas “brasileiras”, que marcam atualmente a Vila de Baltar.
Victorino, talvez, por ter vivido parte da sua vida em Baltar, foi o que teve mais cuidado na preservação dos seus bens, nomeadamente da sua casa, deixando a familiares de maior estima e consideração, conforme mencionado no seu testamento. 

Muita mais informação poderá ser divulgada pela muita documentação de Victorino, compilada em arquivo de sua casa e cujos atuais familiares a preservam.
Haja intenção futura na sua divulgação!

(artigo da Revista Orpheu nº. 2, Câmara Municipal de Paredes)

16 de fevereiro de 2020

Quinta do Meilão - Águas Santas



Quinta do Meilão



Esta quinta e casa senhorial não tem qualquer estudo ou apresentação da sua história que permita alguma informação.
Mas tudo indica pelas peças decorativas existentes que terá sido uma quinta com alguma dimensão, para além de incluir uma capela privada incorporada na casa de família.
Actualmente está associada a uma instituição de promoção à saúde, e tem a designação de Comunidade Terapêutica do Meilão, criada em 1999, dirigida ao apoio a pessoas com problemas de toxicodependência e a reaprender a viver sem drogas.
Fachada norte 

Fachada principal

Questionada uma das proprietárias nada soube dizer sobre os antepassados desta casa.
A pedra de armas, partida com dois apelidos e que se supõe serem dos Pereira e dos Barroso, com timbre de Barroso.
Na revista n.º 2 do Ano 2, Revista da Maia, nova série, julho/dezembro de 2017, reedição da original descreve o seguinte:
“(…) No interior da quinta ergue-se um edifício solarengo, do século XVIII, de insinuação barroca, do qual se destacam os frontões triangulares sobre as janelas da fachada principal, varandas, cornijas e cunhais, e do lado norte e bem escalonada escadaria, resguardada por robusto corrimão de pedra, rematado inferiormente por uma cinzelada voluta ao estilo da época.
Ao fundo, virada também para norte e integrada no corpo do edifício, a frontaria de uma capela, em pedraria de talhe requintado, no cimo da qual, incisa no granito, junto de outras inscrições, está a data de 1704 ou 1706 (?).
Capela (atualmente adulterada como espaço de lazer)

placa em granito inserida na fachada da capela (ilegível)

Na frente do edifício, entre os frontões que encimam as janelas do andar, adossado à parede e enquadrado na envolvência arquitectónica da fachada, impõe-se o exuberante brasão.
Talhado em granito, este espécime compõe-se de escudo de campo plano, cuja linha do partido se salienta ligeiramente, bem como a do contorno, à feição de debrum que também se adapta à proposta decorativa do conjunto. Dentro, numa das partes, figura uma cruz florenciada, vazada; na outra, cinco leões esculpidos quase a todo o vulto, mas sem grande carácter. O escudo é encimado por um elmo de configuração atarracada e pouco expressiva, no qual se apoia, como timbre, um elemento zoomórfico – leão. Do elmo saem, sem que seja nítida a sua inserção, sinuosos elementos que, descendo até à ponta do escudo, constituem o paquife. Na zona inferior, outros motivos decorativos rematam esta pedra de armas.
Pedra de Armas

A sua composição sugere a seguinte leitura heráldica: Partido: o primeiro de (?), uma cruz florenciada de (?) e ligeiramente elevada; o segundo de (vermelho), cinco leões de (púrpura) em sautor, armados e lampassados de (oiro). Elmo de (prata) guarnecido de (oiro) e virado à destra e paquife de (?) e de (?). Timbre e um leão do escudo.
Estas armas congregam duas referências. Pela pesquisa bibliográfica efetuada torna-se difícil a atribuição das armas do primeiro do partido, porquanto várias são as famílias que exibem a cruz florenciada vazia como armas suas. Daí poder tratar-se dos PEREIRA, mas também dos TOLOSA, dos MEDRANO, dos MEIRA, entre outros.; hipóteses que não se colocariam se no momento tivessem sido identificados os primeiros senhores da propriedade, o que não aconteceu. Quanto ao segundo do partido, trata-se das armas dos BARROSO.
Mas relativamente as estas ultimas, se o brasonamento aqui proposto está de acordo com o livro do Armeiro-Mor, diferencia-se, no entanto, do de outras versões, entre as quais a do Armorial Lusitano, por exemplo, onde nos aparece o azul dos leões sobre o vermelho do campo (esmalte sobre esmalte), contrariando até, as regras estabelecidas.”
Chafariz interior

Fonte interior

Muro decorativo com cruz

Portal de entrada (provavelmente alterada com o tempo)


Fonte em espaço exterior (tudo indica ter pertencido à quinta)

Observações sobre o brasão
Esta quinta pelo seu nome "Meilão", aparenta não ter uma relação à língua portuguesa pois não está associada a nenhum contexto. Contudo, poderá ter sido proveniente da Galiza, pois ao que tudo indica esta casa estaria associada a Dona Inácia Joana Meilão Pereira e que era casada com o Desembargador João Barroso Pereira.
O brasão acima deverá ser dos Pereira e Barroso semelhante ao brasão que estava aplicada na fachada do palacete do Largo de Guilherme Gomes Fernandes, no Porto, e que nos anos 60 do século passado terá sido demolido.
De acordo com o documento junto poder-se-á ler que António Barroso Pereira, filho deste casal, também desembargador, era casado com Dona Maria Inácia da Costa Sampaio.
Documento retirado de https://digitarq.pt/details?id=7670350

Deste documento se conclui que António Barroso Pereira era filho de João Barroso Pereira, natural da freguesia de Stª. Maria do Salto, concelho de Montalegre, Cavaleiro da Ordem de Cristo, Familiar do Santo Ofício, Corregedor do Cível da Relação do Porto, e sua mãe Dona Inácia Joana Meilão Pereira, natural da cidade do Porto. Era neto paterno de António Barroso Pereira, com mesmo nome, natural de Stº. Maria do Salto e de sua mulher Dona Maria Pereira, natural do lugar da Pereira, freguesia de Stª. Maria do Salto, ambos do concelho de Montalegre; e neto materno do Capitão António Meilão, natural de Pontes de Dume e morador na cidade do Porto, Familiar do Santo Ofício, e de sua mulher Dona Maria Fernandes, natural de Pontes de Dume, arcebispado de Santiago da Galiza.
Não havendo certezas desta relação, ficará para futuras pesquisas a relação entre estas duas casas.

19 de janeiro de 2020

Quinta da Corga II - Águas Santas


Rua da Corga (foto antiga) - Águas Santas, Maia

Esta segunda foto foi retirada da Revista da Maia, Nova Série, Ano 2 - nº. 2 de julho/dezembro de 2017, que a autarquia reeditou e contém em PDF no seu site.
Nessa mesma revista refere a uma segunda pedra de armas existente na mesma quinta que se sobrepujava sobre o portal de entrada da quinta, mas que actualmente ou foi substituída ou adulterada.
Vista da entrada principal - Rua da Corga- Águas Santas, Maia


Da revista extrai-se o seguinte texto:

Brasão da Quinta da Corga - II
"Talhado em granito local, encontra-se embutido na fachada principal do edifício anteriormente referido (no interior, ao fundo de amplo quinteiro, ergue-se o edifício de habitação, antigo, mas reconstruído ou ampliado no século XVIII, de que são características a ala alpendrada do lado sul, com escada). Escudo de contorno algo sui generis. Campo dividido em quatro partes por uma nervura que se salienta ligeiramente, percorrendo-o horizontal e verticalmente para se intersectar no centro, em ângulo recto. cada uma dessas partes (quartéis) é rebaixada a partir da nervura vertical, deixando emergir as formas algo grosseiras de duas flores-de-lis e de dois leões em posição pouco definida. Assente num ornato que sugere uma tarja, o escudo é encimado por uma coroa aberta, indefinida nos seus remates, do interior da qual parece sair umgorjal que cobre o bordo superior do escudo, este ladeado de elementos de sinuoso, sugerindo o paquife que não chega a ser.
A leitura heráldica poderá ser esta: Esquartelado, o primeiro e quarto de (?), uma flor-de-lis de (?) virada à destra; o segundo e o terceiro de (?9, um leão de (?). Coronel de nobreza.
Como em outros casos, não é possivel, por agora, ir-se mais além. Tarta-se de armas compostas, com certeza, podendo um dos ramos relacionar-se com as dos Barbosa."

7 de janeiro de 2020

Gungunhana, o rei de Gaza


Gungunhana – Rei de Gaza

Foto de Gungunhana, Rei de Gaza

Foto de Gungunhana, no inicio do seu reinado



Introdução:
Em pleno séc. XXI já só a população de meia-idade, com mais de 50 anos, se lembra desta figura que era referida nos livros de história e que se aprendia nas nossas escolas primárias.
Claro que após o 25 de Abril, este conteúdo histórico teria de ser retirado por se entender ser nefasto, pouco ético e social a abordagem deste assunto pelos motivos da opressão e do colonialismo exercidos por parte de Portugal.
Também é verdade que nos relatos da nossa história, em quase 900 anos, nem tudo foram glórias, alegrias, grandezas, actos heróicos, como foram sempre abordados nos nossos livros escolares.
Em tudo na vida deveremos contextualizar no tempo as acções e decisões tomadas por todos aqueles que se manifestaram, que governaram e tiveram acções de maior ou menor relevo na sua decisão, desde o período em que Portugal se tornou numa nação.
Ora, Gungunhana era uma figura de grande impacto em África, pela extensão do seu reino e pelo poderio da sua etnia. Essa área de ocupação estava compreendida numa grande parte integrante de Moçambique e que nessa época era relevante para a ocupação de Portugal, pelos seus interesses económicos e pela área geo-referencial perante o mundo.
A Alemanha e Inglaterra eram também países intervenientes e preponderantes no domínio da faixa sul do continente africano e não lhes era alheia a aceitação da ingerência de Portugal neste espaço do mundo, onde à época o foco pela busca de riqueza, através das explorações mineiras, linha férrea e da escravatura, perante a imagem mundial pela sua ocupação e domínio eram assuntos de importância mundial.

Quem foi:
Gungunhana foi o último monarca da dinastia Jamine, cognominado o “Leão de Gaza”, e o seu reinado estendeu-se desde o ano de 1884 até 29 de dezembro de 1895, dia que foi feito prisioneiro por Joaquim Augusto Mouzinho de Albuquerque, na aldeia fortificada de Chaimite.
Foto de Gungunhana, em 1891


Com o nome original de Ngungunhane, mais correctamente Mdungazwe Ngungunyane Nxumalo ou Reinaldo Frederico Gungunhana.
Terá nascido em Gaza, Moçambique, no ano de 1859 e faleceu a 23 de dezembro de 1906, na Ilha Terceira, em Angra do Heroísmo após condenação ao exílio, como desterro, nesta ilha dos Açores.
Subiu ao trono em 1884 ao qual viria a ser cognominado o Leão de Gaza, e nasceu em território, que seu pai dominava, entre os rios Zambeze e Incomati, mais provavelmente nas margens do rio Limpopo, região onde o centro de poder “angune” então se localizava.
Era filho de Muzila ou Mzila (f-1885), rei de Gaza entre 1861 e 1884, e de Yosio. Por sua vez era neto de Manicusse (antes chamado de Soshangane), fundador e imperador de Gaza (f-1858) que vindo do sul, da Zululândia, tinha fundado o Império de Gaza.

Origem do Império de Gaza:
Gungunhana nasceu numa sociedade complexa e num período de grande instabilidade social e politica.
Seu avô era rei de um povo de língua “nguni”, depois denominada pelos portugueses de “angune” ou “vátua” e líder incontestado de um poderoso exército que ao longo de décadas migrara para o norte desde a Zululândia, submetendo ao longo da década de 1820 cerca de duas centenas de tribos, cujos chefes passaram a ser seus régulos vassalos.
Após terem partido das suas terras ancestrais, actual África do Sul, os guerreiros angunes moveram-se incessantemente pelos territórios entre os rios Maputo e Zambeze, esmagando os povos autóctones fundando um império a que deram o nome de Gaza e que na fase inicial ocupava cerca de 56.000 Km2 tendo atingido aproximadamente os 90.000 Km2.
Actualmente a região de Gaza contempla uma área ligeiramente menor de 75.709 Km2 reajustada pela administração portuguesa.

 Distrito de Gaza, Moçambique

Ao longo dos vinte anos de percurso, o centro do poder angune estabeleceu-se em torno do vale do Limpopo onde fundou a aldeia de Chaimite e aí fixou a sua capital.
Com a chegada dos angunes e as convulsões então provocadas em todo esse percurso os povos locais e os comerciantes portugueses estabelecidos ao longo da costa moçambicana foram rudemente massacrados e a submissão forçada a um novo poder, tendo criado um clima de insegurança e medo que permaneceria durante décadas.
Em agosto de 1840, Portugal enviou uma embaixada à corte de Manicusse, chefiada pelo alferes Caetano dos Santos Pinto tendo recebido as instruções de estabelecer um tratado de amizade, havendo entre as partes trocas de oferendas.
Perante tal proposta o rei Manicusse declarou que no momento não via qualquer vantagem no referido tratado com o rei de Portugal, conforme foi expresso no relatório de 18 de novembro desse ano, apresentado e registado pelo escrivão da Fazenda Nacional em Inhambane.
Contudo os ataques continuariam mantendo-se o clima de instabilidade na região perante os portugueses estabilizados no país.
Com a morte de seu avô Manicusse, em 1858, a disputa pelo trono foi travada entre seu pai Muzila e seu tio Mawewe, tendo este saído vitorioso e que logo de imediato terá atacado todos os seus irmãos de modo a ganhar poder.
Apenas o pai de Gungunhana conseguiu fugir para o Transval, onde organizou um exército para atacar seu irmão e que provavelmente o terá levado em tenra idade.
Durante estes anos e até 2 de novembro de 1861, seu tio demonstrava prepotência e uma maior agressividade que seu antecessor criando um sentimento de ameaça às populações coloniais e locais e especialmente aos portugueses.
Um dos exemplos de exigências foi a imposição de pagamento de tributo na colónia de Lourenço Marques, quer em fornecimento de calçado quer em dupla tributação para as mulheres grávidas, implicando uma ameaça de guerra de extermínio contra os interesses portugueses na região.
O Governador da praça de Lourenço Marques, Onofre Lourenço de Paiva de Andrade, terá respondido com o envio de um cartucho dizendo que seria aquela a forma de pagamento do tributo provocando uma declaração de guerra.
Nessa data chegaram a Lourenço Marques enviados de seu pai, Muzila, informando a aceitação do apoio português na contenda a troco de vassalagem, assumindo-se a partir daí como rei.
A batalha deu-se em finais de novembro de 1861 numa linha de quatro léguas entre as praias da Matola e as terras de Moamba e que apesar de ter menos homens saiu vitorioso. Dia 30, após esta vitória, apresenta-se no presídio de Lourenço Marques, sendo amigavelmente recebido pelo governador.
A 1 de dezembro foi celebrado o tratado em que Muzila se declarava súbdito português e elaborada uma acta que depois de aprovada pelo governo português, acabaria publicada e incluída no nº. 4 da publicação Termos de Vassalagem (1858-1889).
A 16 de dezembro travou-se uma decisiva batalha permitindo a consolidação da nova aliança em troca de armamento, apoio regional e lideres locais, que preferiam submeter-se à suserania do rei de Portugal em vez da hegemonia local do predecessor, Mawewe.
Esta guerra continuaria até 1864, tendo sido deslocalizada a capital do reino do vale do Limpopo para Mossurize, a norte do rio Save, correspondendo a actual província de Manica.
Seu pai, Muzila, foi dominando progressivamente os angune e os povos vassalos e a partir dessa data tornou-se rei incontestado do Império de Gaza, passando Gungunhana a ser um dos príncipes em ascensão e potencial sucessor de seu pai, iniciando o seu caminho para o poder.

Ascensão e queda:
Foi nesta região do vale do Limpopo dos anos 50, no enquadramento social e politico, que nasceu Mundagaz, ou popularmente conhecido com o nome de Gungunhana, de sangue real e um dos candidatos a herança do trono.
Educado para a vida de guerreiro e tendo acompanhado seu pai e avô, desde tenra idade, nas grandes caminhadas que empreendiam todos os anos através da região dos seus vastos domínios.
Toda a sua formação foi direccionada para a luta e poder, aprendendo as tácticas de guerra e negociações desde criança ainda no reinado de seu avô, Manicusse.
Com 34 anos de idade iniciou a sua governação, ano de 1884, herdando uma área territorial extensa e uma população com mais de meio milhão de habitantes.
Gungunhana em Manjacaze, em 1895

Fixou a sua corte em Manjacaze tornando-a capital de Gaza, onde iniciou a sua governação num período critico para o continente africano.
Coincidia com a Conferência de Berlim (15 de novembro de 1884 - 26 de fevereiro de 1885), também conhecida por Conferência da África Ocidental ou do Congo, consistindo na colaboração europeia pela partição e divisão territorial daquele continente.
Logo em janeiro de 1885 tomou a iniciativa, fundamentalmente com os portugueses e com a Europa, como prioridade governativa. Contacta as autoridades portuguesas em Chiloane, enviando um presente e a anunciação da sucessão do reino. Este gesto foi visto como uma oportunidade para reforçar a presença portuguesa juntos com as comunidades locais do seu reino e especialmente com os augunes ou vátua, como também eram designados.
As convulsões territoriais a partir daí acentuaram-se perante a cobiça por parte da Grâ- Bretanha e da Alemanha tendo o governo português agindo rapidamente de modo a garantir a área dominante face à provável perda de território, tendo assinado um tratado, no ano de 1886, com o chanceler alemão, o tratado da delimitação das colónias dos dois países. posteriormente anexado ao documento, em 1887, o mapa "cor de rosa", onde Angola e Moçambique se uniam territorialmente, passando toda a área para a soberania portuguesa, e onde nela fazia parte o Império de Gaza.
Mapa "Cor de Rosa"

Face à crescente presença britânica no território e em particular a passagem pela região por um comando britânico com 5000 soldados, o governo português decide aproveitar as boas relações com o novo régulo, Gungunhana, e nomear um residente português junto a sua corte que servisse de oficial e de ligação como embaixador e conselheiro politico.
A escolha recaiu por um aventureiro da região com larga experiência, onde tinha já sido militar, comerciante e funcionário público, de nome José Casaleiro Alegria, que gerou controvérsia, invejas e descontentamentos e que viria a ter larga influência nos acontecimentos subsequentes.
Esta nomeação em 1885 foi muito bem recebida na corte de Gungunhana, ganhando rapidamente a confiança deste e dos principais lideres políticos.
Rapidamente é entendido por parte do governo português em assinar um novo tratado em substituição do de 1861, com seu pai, que se encontrava manifestamente desactualizado e esquecido.
Para tal, Gungunhana decidiu enviar uma embaixada a Lisboa nomeando Casaleiro Alegria com plenos poderes perante Portugal.
Conjuntamente com ele partiram outros dois representantes, nobres de outras etnias, e que as suas crenças e tabus lhes permitiam atravessar o mar, pois tal acto para os augunes tal seria impossível e irrealizável por lhes ser tabu.
Para Portugal estas diligências transformaram-se em desconfianças tendo levantado suspeitas e intrigas, sendo a embaixada considerada por muitos como uma impostura. Mesmo assim, foi recebida pelo Ministério da Marinha e Ultramar a 12 de outubro, sendo nessa altura assinado um tratado de amizade e vassalagem entre os reis de Portugal e de Gaza, publicado em Boletim Oficial da Província de Moçambique de 9 de janeiro de 1886. Este documento oficializava a presença do residente português e permitia a livre circulação de portugueses em Gaza, ao mesmo tempo que concedia a honra de coronel de segunda linha do exercito português e direito a respectiva farda, a Gungunhana.
Todo este processo culminou num outro acordo quer pelas desconfianças criadas, quer por dificuldades da aplicação do tratado, quer pela autenticidade dos poderes de Casaleiro, surgiu uma nova versão, menos ambiciosa nos propósitos contribuindo para um maior descrédito de todo o processo.
Em 1887, e perdida esta oportunidade, nova embaixada é preparada sendo então enviados dois emissários augunes, N'Tonga da casa de Manjacaze e Udaca da casa de Udengo, sendo desta vez recebidos pelo rei de Portugal, e que aproveitando a sua estadia neste país lhes fizera a apresentação dos arsenais e quartéis com o objectivo de demonstração do poder de Portugal.
Foi igualmente incluída uma visita a um circo mostrando um homem branco a domar um leão, considerando esta proeza de incrível magia e poder aos olhos dos enviados.
Esta visita a Lisboa e as noticias da anexação da Zululânida à colónia natal, a 14 de maio de 1887, levam um período de melhorias nas relações com os portugueses, sendo rapidamente fragilizada pelas decisões tomadas na Conferência de Berlim ao qual a posição portuguesa começa a endurecer, ganhando contornos de gestos imperialistas.
Face ao crescente numero de estrangeiros e de exigências nas suas terras, Gungunhana sente-se ameaçado, quer pelas forças portuguesas quer pelas britânicas e pela aparente ameaça de discórdia interna e face à existência de pretendentes ao trono no exílio, este decide mudar a sua capital de Mossurize para Cambane, cerca de 600 Km a sul, num movimento que desencadearia novas resistências e novas guerras, pois este novo território se posicionaria próximos de povos considerados inimigos.
Esta mudança serviu para um aproveitamento politico tendo em conta as rivalidades existentes entre as potências europeias e defender a independência em relação aos portugueses, aliviando as pretensões sobre as minas de Manica e consolidando a soberania ngungi.
Foto Jornal Ilustrado, nº. 15, de 1/11/1933 - Reconstituição de Kraal (cidade típica Vátua) de Manguanhana, 
na Lagoa de Suli, próximo do Limpopo, construída em 1892 e incendiada em 1895.

Por esta altura Gungunhana tenta apoios dos ingleses e de Cecil Rhodes, inglês e homem de negócios e envolvido na linha de comboio a projectar e que ligaria o Cabo (África do Sul) ao Cairo (Egipto) e que nunca viria a ser concretizado.
Neste período a complexa teia de compromissos seriam permanentemente quebrados e reassumidos, em que ataques aos interesses dos portugueses que logo se seguiam com embaixadas de desculpas e amizades, e os ataques constantes contra povos que se tinham colocado sob a protecção portuguesa não paravam.
Até que surge a 11 de janeiro de 1890 o "ultimato britânico" exigindo a retirada das forças portuguesas na região do rio Chire (Niassalândia) e das terras dos macololos e dos machonas (actual Zimbabwe), razão para a concretização da linha férrea e de outros objectivos por parte de Londres, ameaçando Lisboa com bloqueio naval e acção armada.
De imediato, no próprio dia do ultimato, o rei D. Carlos I apressa-se a comunicar a rainha Vitória de que cederia às exigências apresentadas.
Contudo esta decisão de fraqueza gera uma onda nacionalista e de repudio motivando a administração colonial portuguesa em mudar de posição, acabando os acordos e cooperação e passar a agir e a falar em submissão e vassalagem, no sentido da pacificação, mesmo que implicasse a intervenção armada e o derrube de régulos menos cooperantes.
Foto de Joaquim Augusto Mouzinho de Albuquerque

Em 1891, com a chegada de Joaquim Mouzinho de Albuquerque, ao posto de governador de Lourenço Marques, um monárquico e nacionalista de linha dura, ganha nova acutilância nos dois anos de governação com um endurecimento nas relações com os povos africanos circundantes, acabando com a condescendência que se caracterizava então a presença portuguesa nas décadas anteriores.
Foto de Joaquim Augusto Mouzinho de Albuquerque em ambiente colonial

Entretanto os jogos económicos e políticos por parte dos ingleses e fundamentalmente por parte de Cecil Rhodes, da British South Africa Company elegem a região de Gaza e o porto de Lourenço Marques como objectivos estratégicos para o escoamento das matérias-primas do Transvaal (nordeste de África do Sul), bem como de outras grandes concessionárias que usufruem do poder quase absoluto nos imensos territórios que exploram, a Companhia do Niassa, a Companhia da Zambézia e Companhia de Moçambique.
A força aparente exercida por Mouzinho de Albuquerque resumia-se a uma estreita faixa do litoral e de alguns pontos isolados no interior.
Todas estas frentes procuram atrair de diversas formas Gungunhana para os seus interesses. Por Portugal instala-se um intendente-geral na corte conforme acordo de outubro de 1885, outros apresentam ofertas e Cecil Rhodes obtém de Gungunhana, a troco de um milhar de espingardas, munições e de um subsidio anual em dinheiro, a concessão da exploração de minérios e o acesso ao mar.
Emissários enviados por Gungunhana a Londres, em 1891

Em função destes actos Gungunhana é surpreendido pela rapidez dos acontecimentos e pela radical alteração do comportamento português.
Decide então jogar no conflito entre Londres e Lisboa, mas fica sem resposta o seu pedido de protecção à rainha Vitória, do Reino Unido. Sem que ele soubesse, ambos os governos tinham chegado a acordo na delimitação dos territórios africanos, rubricando em junho de 1891 um entendimento onde Gaza fica, sem margem para dúvidas, integrado no território moçambicano.
O imperador é intimado a assumir-se como súbdito de Portugal, caindo a esperança de qualquer reacção britânica.
A partir daí, desde 1894 foram desencadeadas várias campanhas pelo exercito português para a captura de Gungunhana, tendo como confrontos mais relevantes, em 2 de fevereiro em 1895, na Batalha de Marracuena, em 7 de novembro, da Batalha de Coolela, a 11 de novembro com a destruição de Mandlhacaze, capital do Império, e a 28 de dezembro com a captura do rei, na aldeia fortificada de Chaimite antiga capital do reino.
Postal Ilustrado de quadro a óleo do aprisionamento de Gungunhana

Painel figurativo do aprisionamento de Gungunhana

Desenho de fuzilamento de súbditos de Gungunhana

Peça representativa do aprisionamento de Gungunhana

O desterro:

Com a sua captura e tendo em conta o seu reconhecimento pela imprensa europeia, a administração colonial portuguesa decidiu condená-lo ao exílio em vez de o mandar fuzilar, como fizera com outros.
Foi então decidido que viria para Lisboa, acompanhado pelo filho de nome Godide, suas mulheres e outros dignitários. Após uma breve permanência naquela cidade, seria desterrado para os Açores até ao fim da sua vida.
Foto de Gungunhana com as suas 7 esposas 

Foto de Gungunhana com as suas 7 esposas (após captura)

No dia 13 de janeiro, Gungunhana e 31 prisioneiros, incluindo as 7 esposas por ele escolhidas, foram obrigados a embarcar no barco a vapor "África" rumo Lisboa.
Mais que o exílio, o mar eram temidos por estes africanos de raça aungunes, pois eles não comem peixe e diabolizam a travessia do mar.
Postal de Gungunhana e uma das suas mulheres (a preferida)

De acordo com descrição de um jornal, relata que foram amontoados numa camarata em condições abjectas. Na paragem por Luanda, adquiriram-se roupas para os vestir ao estilo europeu.
Em Cabo Verde foram deixados outros prisioneiros de menor importância também em desterro.
Dois meses depois da partida chegaram a Lisboa, além do rei e seu filho, Godide, o único que já falava português, vinham com eles Molungo, seu tio e velho conselheiro, Matibejana, conhecido por Zixaxa, um régulo que atacara Lourenço Marques e tinha sido traído por Gungunhana, para além das 7 mulheres de Gungunhana e 3 por parte de Zixaxa, e acompanhando-os, Gó, um cozinheiro.
"Na metrópole,  reinava a euforia. Uma multidão apinhou-se no cais à chegada do imperador que a imprensa pintava como um monstro. O Diário de Noticias imprimiu no dia seguinte: Quando entramos nos alojamentos estavam todos os pretos deitados e o Gungunhana, que ocupava uma extremidade da tarimba, tinha o rosto coberto. Alguém lhe descobriu a cara e o preto despertou, olhando para todos com olhos desconfiados. Pouco depois foi ordenado que subisse a pretalhada para a tolda, onde se faria a sua exibição.
Aterrado com o medo da morte, Gungunhana chorava, tremia e oferecia o gado, o marfim e os escravos que já não tinha a troco de um encontro com o rei. Vou morrer? Para que lhes sirvo eu? Deixem-me regressas que morro se não vejo as minhas terras." gritava, segundo a tradução do interprete.
Seu filho, Godide, exibia uma postura diferente, distribuindo mesmo alguns autógrafos aos curiosos.
O cortejo com seis carruagens abertas levou-os até ao Forte de Monsanto, onde ficariam um pouco mais de 3 meses. A animosidade e as ameaças da população foram de tal ordem que no dia seguinte alguns jornais criticaram a passividade da polícia. Os gestos mais repetidos eram o de estrangulamento e de degolação."
A curiosidade acerca dos africanos manteve-se nos meses seguintes e Carlos Enes, no seu Álbum Angrense escreve ainda, que “… o Régulo e os seus almoçavam habitualmente às 7h e jantavam às 16h. O serviço de louça e talheres é como de qualquer europeu; preferem carne, arroz, vinho e aguardente e não comem peixe de qualquer qualidade.” E ainda: “Na camarata onde dormiam, as sete camas dispunham-se da seguinte forma: em duas delas, juntas, ficava Gungunhana entre suas duas favoritas; as outras cinco camas ficavam mais afastadas. (…) A favorita é que limpava a coroa de cera que Gungunhana tinha na cabeça, dando-lhe brilho com óleo especial.” O que mais chocava a sociedade portuguesa, católica e conservadora era a poligamia.
No dia em que anunciaram a mudança para Angra do Heroísmo, a Gungunhana foi dada a possibilidade de escolher uma das mulheres para o acompanhar. Não o fez. Ou iam todas ou não ia nenhuma. As sete acabaram deportadas para deportadas para São Tomé e Príncipe. Foram entregues cobertores e calças de brim aos cativos. “Que por sinal não lhes serviam.”, diz Carlos Enes. “As de Gungunhana, por exemplo, rasgaram-se logo que subiu para o trem.” O acidente suscitou troça de Zixaxa.
O desembarque em Angra do Heroísmo, a 27 de junho de 1896, foi mais humano. Os ilhéus tinham sido sensibilizados para receberem dignamente os desterrados: “Respeitemo-los pois, e que se lhe amenize, quanto possível for, a tristeza do exílio.”, escreveu a União.
(…) Foram levados para o Forte de São João Baptista, que já tinha sido o destino do degredo do rei português D. Afonso VI. “Quando fui destacado para o quartel de Angra, no Forte, o que mais me fascinava era a passagem do Gungunhana”, diz o coronel Luis Sodré de Albuquerque, director do Museu Militar, em Lisboa, que tem no seu acervo a espingarda e espadas de Gungunhana, bem como umas calças gigantescas que se pensa terem-lhe pertencido. “Mas nunca descobri em que sala tinha estado preso.”
Segundo Carlos Enes, ficaram “numa ampla caserna, durante o dia, e à noite numas pequenas casas junto à porta de armas”. Nos primeiros meses, podiam apenas passear pelo recinto do Forte até às 20 h, recolhendo depois à cela. Mas as medidas de segurança foram-se suavizando, permitindo aos reclusos o acesso ao Monte Brasil, um promontório vulcânico cuja única saída para terra passa pela fortaleza, e mais tarde à própria cidade de Angra do Heroísmo.
Recebiam visitas frequentes e até de São Miguel chegavam curiosos para os conhecer. “Para efeitos de vencimento e alimentação foram equiparados a sargentos adidos: recebiam pão, o rancho de oficiais inferiores e o pré-diário de 260 réis”, com Carlos Enes.

Fotografia conjunta com os 4 prisioneiros

Segundo testemunhos da época, Gungunhana alternava entre as boa-disposição e a melancolia, falando muitas vezes das mulheres que deixara para trás. Molungo, carrancudo e desconfiado, nunca se deixou seduzir pelos brancos, rejeitou aprender português e os costumes locais. Já Godide, seu filho, sempre demonstrou ser um rapaz loquaz e divertido, era o que gerava mais simpatia entre os ilhéus da Terceira, alimentando sempre a esperança de voltar ao seu reino, de preferência, confessou a um jornal, “casado com uma mulher branca”.
Zixaxa manteve sempre o porte altivo, como se nem o degredo lhe apagasse a identidade de chefe militar. (…)
O passatempo preferido dos augunes era a caça ao coelho bravo, no Monte Brasil, “Faziam-na com paus afiados, segundo a tradição zulu, de que descendiam”, afirma Sodré de Albuquerque.
“Apanhavam com cães e furão, às vezes oito a dez coelhos, que depois cozinhavam à sua moda, acompanhando o festim com vinho tinto em tal quantidade que ficavam perdidos de bêbados. Era o seu fraco”, escreveu o jornal Vida Académica, em 1936, o tenente-coronel José Agostinho, que com eles conviveu na ilha.
Os africanos eram também vistos nas tabernas de Angra do Heroísmo e, mais segundo a tradição oral do que em registos escritos, eram levados às prostitutas da povoação.
Os açorianos seguiam a vida dos forasteiros com atenção e fizeram-se notícias da noite em que Gungunhana caiu da cama ou mesmo dos seus hábitos de limpeza. (…)
 Gozavam de grande popularidade; as meninas usavam chapéus com abas “à Gungunhana”, o Teatro Angrense dedicou-lhes a peça “Gungunhana nos Açores”, a fábrica de tabaco Flor de Angra oferecia brindes com as suas fotografias.
Postal Ilustrado de 1904, com os 4 desterrados já com com os seus nomes de baptismo


Por pressão das autoridades, foram baptizados em 1899, na Sé Catedral, numa cerimónia pomposa e muito participada. Trajados com fraque, lenço, cartola e polainas, foram apadrinhados pela elite da sociedade angrense e adoptaram nomes cristãos: Reinaldo Frederico Gungunhana, António da Silva Pratas Godide, Roberto Frederico Zixaxa e José Frederico Molungo. A predominância do nome Frederico serviu de homenagem ao governador do Forte, o general Frederico Augusto Pinheiro."
                                                                                                    Assento de baptismo
                                                                                                                        Assento de óbito 
Após 10 anos de desterro, devido a vítima de hemorragia cerebral, o rei faleceu com 60 anos, a 23 de dezembro de 1906. Foi enterrado na véspera do Natal rodeado de seus companheiros e pouco mais participantes. Seu filho sucumbiu em 1911 com tuberculose e no ano seguinte seu tio Molungo.
Zixaxa foi o único que perdurou tendo tido dois filhos de uma açoriana e ficado a trabalhar como guarda do Monte Brasil até ao fim de vida ao qual sucumbira a uma lesão cardíaca em 1927.


O regresso:
A sua trasladação e requisição foi previamente solicitada por Samora Machel, aproveitando sua visita a Portugal, considerada como visita de reconciliação e fraternal entre os dois países.
A 4 de outubro de 1983, a autorização foi concedida por despacho de Mota Amaral, então Presidente do Governo Regional dos Açores permitindo que a 7 de outubro de 1983, aquando da chegada do Presidente moçambicano.
Chegada de Samora Machel a Portugal, a 7 de outubro de 1983

Infelizmente este processo criou algum desconforto entre as relações dos dois países, pois Gungunhana tinha sido enterrado em sepultura para pobres e muitos cadáveres lhe haviam sucedido naquela cova tornando-se impossível o reconhecimento das suas ossadas.
A decisão foi de se levantar umas ossadas quaisquer, encaixotá-las e enviá-los ao Ministério dos Negócios Estrangeiros.
O gesto não caiu bem e o Governo revendo a sua posição inicial entendeu como mais adequado entregar ao presidente moçambicano apenas uma caixa com terra do local onde tinha sido enterrado.
Assim foi, do cemitério foi retirada uma porção de terra para um pote de cerâmica e pronta para ser enviada, tendo ficado dois anos à espera na capela do Palácio das Necessidades, em Lisboa, a aguardar que Moçambique preparasse uma cerimónia de trasladação condigna.
No entanto o episódio ainda fez correr muita tinta. Insatisfeito com a dimensão do pote, Samora Machel dirigiu ao governo português uma carta exigindo o cadáver real, e num caixão, sob o risco de o povo não levar a sério o acontecimento.
Quando se julgava que Gungunhana podia finalmente repousar em paz nas margens do rio Limpopo, o seu busto em Mandlakazi foi vandalizado por membros de uma etnia rival dos augunes, os chopes.
Finalmente, a 15 de junho de 1985, os moçambicanos nunca tinham visto um caixão tão belo a aterrar em solo moçambicano com os restos mortais de Gungunhana. O caixão tinha 2.0 m de comprimento e 0.75 m de altura, pesando 225 Kg e apresentando uns baixo relevos do escultor Paulo Cosme.
Um desfile que percorreu num cortejo pela cidade, seguida por milhares de pessoas, até ao Salão Nobre do Conselho executivo, de onde sairia mais tarde para a sua morada final, a Fortaleza de Maputo, com lápide de herói nacional. Nele apenas restava um punhado de terra do cemitério da Conceição, de Angra do Heroísmo, onde fora discretamente enterrado sem direito a lágrimas nem tiros de canhão.
Gungunhana ficará para a história de que foi e será sempre uma figura contraditória: um hábil negociador, pródigo em fazer alianças para segurar o império, mas sem pudor para matar inimigos, mulheres e crianças; e um líder temerário que, na derrota, se desfez em lágrimas e em súplicas para evitar a morte, preferindo ser exibido em Lisboa como troféu da glória colonial.
Já passados mais de cem anos após a sua morte muito se escreveu sobre esta figura, com histórias, contos e lendas, verdades ou mentiras, retiradas de relatos escritos e orais. 
Poderão ler ainda mais sobre Gungunhana em obras cuja investigação e veracidade poderão acrescentar sobre a sua vida.





Fontes e Informações e fotos retiradas de:
- http://ardinadarede.blogspot.com
- http://jornalagora.pt
- https://delagoabayworld.wordpress.com
- http://www.esferadoslivros.pt
- https://www.fnac.pt
- hyttps://pt.wikipedia.org
- https://macua.blogs.com
- https://www.coisas.com
- https://i.pinimg.com
- https://fotos.web.sapo.io
- https://www.flickr.com
- https//www.jn.pt
- htpps://expressa.pt
- https://www.dw.com
- https://www.sabado.pt
- htpps://docplayer.com.br